As faces da infância em contextos de violência física intrafamiliar
Resumo
O Estatuto da Criança e do Adolescente, legislação que estabelece os
direitos e as garantias dessa parcela da população, especifica que a criança é um
sujeito em momento especial de desenvolvimento e que deverá estar protegida
de toda forma de violência, agressão, negligência, dentre outras ações que
possam prejudicar esse desenvolvimento. Reconhecer o caráter “especial”
atribuído à condição de/do ser criança tributário, principalmente, dos saberes
“Psi”, implica assumir a necessidade de práticas sociais igualmente especiais.
Dessa forma, a família, a escola e as demais instituições socializadoras
mobilizam-se, ou, ao menos deveriam fazê-lo, no sentido de tanto serem
agentes na efetivação dos direitos e garantias estabelecidos pelo referido
Estatuto, quanto de denunciarem casos em que a transgressão do mesmo ocorre.
Essa realidade – de transgressão - atinge uma parcela significativa de crianças,
visto que seu cotidiano é permeado pelas mais variadas formas de violência,
dentre as quais destacamos a violência física intrafamiliar. Como essas crianças
concebem sua própria “condição de infância”? O que justifica, no olhar da
criança, a prática de violência por membros de sua família? A partir dessas
reflexões é que realizamos esta investigação, procurando compor uma
concepção de infância considerando os sentidos e valores que essa população
atribui à sua condição. Para a efetivação desse objetivo participaram da
pesquisa sete crianças, na faixa etária de 7 a 12 anos, sobre as quais haviam
sido encaminhadas denúncias de violência intrafamiliar ao SOS Criança, do
município de Natal/RN. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas,
produção e interpretação de desenhos e a história de Pinóquio, como
desencadeadores do discurso das crianças. Na análise do corpus da pesquisa
foram identificadas as seguintes condições, que configuram o que é ser criança
para os sujeitos investigados: 1.) gostar de brincar (o que a criança mais gosta
de fazer!); b.) ter uma família (nuclear); 3.) ter amigos; 4.) estudar/ir para a
escola; 5.) trabalhar, em casa ou externamente, para ajudar os pais. Quando
investigamos os padrões de relacionamento no espaço familiar com o objetivo
de abordar o que justifica, na concepção da criança, os atos de violência dos
quais é vítima, um aspecto recorrente em seus discursos mereceu destaque. Diz
respeito ao papel que a criança ocupa nesse espaço e à avaliação que a mesma
faz em relação ao julgamento e às atitudes do adulto quando elas agem de
forma considerada errada por esses adultos. No discurso das crianças está
presente a concepção de que o julgamento do adulto é o que é correto; justifica